"Cada libro, cada tomo que ves tiene alma. El alma de quien lo escribió y el alma de quienes lo leyeron y vivieron y soñaron con el (...) Los libros son espejos: sólo se ven en ellos lo que uno ya lleva dentro"

(Carlos Ruiz Zafón, La sombra del viento)

domingo, 29 de maio de 2011

Dedicatória...

"Kaleba. 
Que nunca te esqueças de ti
que nunca te esqueças de nós
alçando o vôo da liberdade 
infinita num cântico sagrado
cântico tenor
cântico-amor
Feliz Natal,
André Araújo"


Enquanto eu estudo, leio poesia. Estava na biblioteca da PUC recentemente quando pedi ao armazém um dos livros de Cecília Meireles, "Cânticos".  Deparei-me com esta bela dedicatória. O livro marcado pelo tempo, manchado e manuseado. Tentei pesquisar quem seriam os dois personagens, Kaleba e André Araújo. Na ausência de resposta, tentei imaginar. Então deixei-os em paz. Mas sigo encantada pela dedicatória que diz tanto em meio as manchas do tempo que marcam o livro editado na década de 1980. De fato como diz Mia Couto, as palavras - ainda que nossas - não moram em nós. As de André o pertenceram, mas agora, são um pouco minhas também. Seguem dizendo a tantos outros, ainda que o destino primeiro tenha sido Kaleba.
Enfim, embaralhando André, Mia e Cecília sorri:

"acima de nós, em redor de nós
as palavras voam

E às vezes pousam"

(Cecília Meireles)
As de André pousaram em mim...

quinta-feira, 26 de maio de 2011

Lendo Cecília Meireles

Noções

Entre mim e mim, há vastidões bastantes
para a navegação dos meus desejos afligidos.

Descem pela água minhas naves revestidas de espelhos.
Cada lâmina arrisca um olhar, e investiga o elemento que a atinge.

Mas, nesta aventura do sonho exposto à correnteza,
só recolho o gosto infinito das respostas que não se encontram.

Virei-me sobre a minha própria experiência, e contemplei-a.
Minha virtude era esta errância por mares contraditórios,
e este abandono para além da felicidade e da beleza.

Ó meu Deus, isto é minha alma:
qualquer coisa que flutua sobre este corpo efêmero e precário,
como o vento largo do oceano sobre a areia passiva e inúmera...

Cecília Meireles

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Muitas formas de dizer

"A mãe da minha da mãe falava com os olhos e acho que por isso o carinho ficou sendo azul pra sempre.
A mãe do meu pai falava num dialeto que eu não conseguia entender e acho que por isso aprendi a ler sorrisos.
As palavras se dizem de muitos jeitos."
 
(Silvana Tavano)

Ler em qualquer lugar

domingo, 15 de maio de 2011

Para quem gosta de livros

Li hoje no Blogão de Alexandre, autor de livro infantil e pai de amigo de minha filha: há nas bancas e online uma revista de boa qualidade dedicada à Literatura. Chama-se CONHECIMENTO PRÁTICO REVISTA LITERATURA. Nos links vão acessar respectivamente o blog do Alex Gomes e a revista. Divirtam-se nos dois.

quarta-feira, 11 de maio de 2011

Memórias da minha meniniçe

Na Quarta série a escola preparou uma feira literária na qual cada aluno da sala tinha que recitar uma poesia do Pedro Bandeira.Eu escolhi uma que  me identifiquei muito, pois ela transmitia tudo o que eu sentia na época. Foi muito difícil recitar a poesia, eu tive que gravá-la e ela era grande, fora à vergonha que eu senti em falar em público.Mas deu tudo certo, consegui recitá-la e essa experiência me marcou muito. Ainda lembro com muito carinho desse dia, da poesia e do livro. Acabando com o suspense, a coloco na íntegra. 


“Vai já pra dentro, menino!” IN: BANDEIRA, Pedro. Mais respeito eu sou criança!São Paulo: Moderna, 1994.

Vai já pra dentro, menino!
Via já pra dentro estudar!
É sempre essa lengalenga
Quando o que eu quero é brincar...                                                        

Eu sei que aprendo nos livros,
Eu sei que aprendo no estudo,
Mas o mundo é variado
E eu preciso saber tudo!

Há tanto pra conhecer,
Há tanto pra explorar!
Basta os olhos abrir,
E com o ouvido escutar.

Aprende-se o tempo todo,
Dentro, fora, pelo avesso,
Começando pelo fim,
Terminando pelo começo!

Se eu me fecho lá em casa,
Numa tarde de calor,
Como eu vou ver uma abelha
A catar pólen na flor?

Como eu vou saber da chuva,
Se eu nunca me molhar?
Como eu vou sentir o sol,
Se eu nunca me queimar?

Como eu vou saber da terra,
Se eu nunca me sujar?
Como eu vou saber das gentes,
Sem aprender a gostar?

Quero ver com os meus olhos, quero a vida até o fundo,
Quero ter barro nos pés,
Eu quero aprender o mundo!

Rubem Alves e a Leitura

Prazer da leitura - Rubem Alves

Rubem Alves
Gaiolas ou Asas – A arte do voo ou a busca da alegria de aprender
Porto, Edições Asa, 2004

Excertos adaptados

Alfabetizar é ensinar a ler. A palavra alfabetizar vem de "alfabeto". "Alfabeto" é o conjunto das letras de uma língua, colocadas numa certa ordem. É a mesma coisa que "abecedário". A palavra "alfabeto" é formada com as duas primeiras letras do alfabeto grego: "alfa" e "beta". E "abecedário", com a junção das quatro primeiras letras do nosso alfabeto: "a", "b", "c" e "d". Assim sendo, pensei a possibilidade engraçada de que "abecedarizar", palavra inexistente, pudesse ser sinónimo de "alfabetizar"...

"Alfabetizar", palavra aparentemente inocente, contém a teoria de como se aprende a ler. Aprende-se a ler aprendendo-se as letras do alfabeto. Primeiro as letras. Depois, juntando-se as letras, as sílabas. Depois, juntando-se as sílabas, aparecem as palavras...

E assim era. Lembro-me da criançada a repetir em coro, sob a regência da professora: "bê-á-bá; bê-e-bê; bê-i-bi; bê-ó-bó; bê-u-bu"... Estou a olhar para um postal, miniatura de um dos cartazes que antigamente se usavam como tema de redacção: uma menina deitada de bruços sobre um divã, queixo apoiado na mão, tendo à sua frente um livro aberto onde se vê "fa", "fe", "fi", "fo", "fu"...

Se é assim que se ensina a ler, ensinando as letras, imagino que o ensino da música se deveria chamar "dorremizar": aprender o dó, o ré, o mi... Juntam-se as notas e a música aparece! Posso imaginar, então, uma aula de iniciação musical em que os alunos ficassem a repetir as notas, sob a regência da professora, na esperança de que, da repetição das notas, a música aparecesse...

Todo a gente sabe que não é assim que se ensina música. A mãe pega no bebé e embala-o, cantando uma canção. E a criança percebe a canção. O que o bebé ouve é a música, e não cada nota, separadamente! E a evidência da sua compreensão está no facto de que ele se tranquiliza e dorme – mesmo nada sabendo sobre notas!

Eu aprendi a gostar de música clássica muito antes de saber as notas: a minha mãe tocava-as ao piano e elas ficaram gravadas na minha cabeça. Somente depois, já fascinado pela música, fui aprender as notas – porque queria tocar piano. A aprendizagem da música começa como percepção de uma totalidade – e nunca com o conhecimento das partes.

Isto é verdadeiro também sobre aprender a ler. Tudo começa quando a criança fica fascinada com as coisas maravilhosas que moram dentro do livro. Não são as letras, as sílabas e as palavras que fascinam. É a história. A aprendizagem da leitura começa antes da aprendizagem das letras: quando alguém lê e a criança escuta com prazer. A criança volta-se para aqueles sinais misteriosos chamados letras. Deseja decifrá-los, compreendê-los – porque eles são a chave que abre o mundo das delícias que moram no livro! Deseja autonomia: ser capaz de chegar ao prazer do texto sem precisar da mediação da pessoa que o está a ler.

Num primeiro momento, as delícias do texto encontram-se na fala do professor. Usando uma sugestão de Melanie Klein, o professor, no acto de ler para os seus alunos, é o "seio bom", o mediador que liga o aluno ao prazer do texto. Confesso nunca ter tido prazer algum em aulas de gramática ou de análise sintáctica. Não foi nelas que aprendi as delícias da literatura. Mas lembro-me com alegria das aulas de leitura. Na verdade, não eram aulas. Eram concertos. A professora lia, interpretava o texto, e nós ouvíamos, extasiados. Ninguém falava.

Antes de ler Monteiro Lobato, eu ouvi-o. E o bom era que não havia exames sobre aquelas aulas. Era prazer puro. Existe uma incompatibilidade total entre a experiência prazerosa da leitura – experiência vagabunda! – e a experiência de ler a fim de responder a questionários de interpretação e compreensão. Era sempre uma tristeza quando a professora fechava o livro...

Vejo, assim, a cena original: a mãe ou o pai, livro aberto, a ler para o filho... Essa experiência é o aperitivo que ficará para sempre guardado na memória afectiva da criança. Na ausência da mãe ou do pai, a criança olhará para o livro com desejo e inveja. Desejo, porque ela quer experimentar as delícias que estão contidas nas palavras. E inveja, porque ela gostaria de ter o saber do pai e da mãe: eles são aqueles que têm a chave que abre as portas de um mundo maravilhoso!

Roland Barthes faz uso de uma linda metáfora poética para descrever o que ele desejava fazer, como professor:maternagem – continuar a fazer aquilo que a mãe faz. É isso mesmo: na escola, o professor deverá continuar o processo de leitura afectuosa. Ele lê: a criança ouve, extasiada! Seduzida, ela pedirá: Por favor, ensine-me! Eu quero poder entrar no livro por minha própria conta...

Toda a aprendizagem começa com um pedido. Se não houver o pedido, a aprendizagem não acontece. Há aquele velho ditado: É fácil levar a égua até ao meio do ribeirão. O difícil é convencer a égua a beber. Traduzido pela Adélia Prado:Não quero faca nem queijo. Quero é fome. Metáfora para o professor.

Todo o texto é uma partitura musical. As palavras são as notas. Se aquele que lê é um artista, se ele domina a técnica, se ele desliza sobre as palavras, se ele está possuído pelo texto – a beleza acontece. E o texto apossa-se do corpo de quem ouve. Mas se aquele que lê não domina a técnica, se luta com as palavras, se não desliza sobre elas – a leitura não produz prazer: queremos logo que ela acabe.

Assim, quem ensina a ler, isto é, aquele que lê para que os seus alunos tenham prazer no texto, tem de ser um artista. Só deveria ler aquele que está possuído pelo texto que lê. Por isso eu acho que deveria ser estabelecida nas nossas escolas a prática dos "concertos de leitura". Se há concertos de música erudita, jazz – por que não concertos de leitura? Ouvindo, os alunos experimentarão o prazer de ler.

E acontecerá com a leitura o mesmo que acontece com a música: depois de termos sido tocados pela sua beleza, é impossível esquecer. A leitura é uma droga perigosa: vicia... Se os jovens não gostam de ler, a culpa não é só deles. Foram forçados a aprender tantas coisas sobre os textos – gramática, usos da partícula "se", dígrafos, encontros consonantais, análise sintáctica – que não houve tempo para serem iniciados na única coisa que importa: a beleza musical do texto. E a missão do professor?

Acho que as escolas só terão realizado a sua missão se forem capazes de desenvolver nos alunos o prazer da leitura. O prazer da leitura é o pressuposto de tudo o mais. Quem gosta de ler tem nas mãos as chaves do mundo. Mas o que vejo a acontecer é o contrário. São raríssimos os casos de amor à leitura desenvolvido nas aulas de estudo formal da língua.

Paul Goodman, controverso pensador norte-americano, diz: Nunca ouvi falar de nenhum método para ensinar literatura (humanities) que não acabasse por matá-la. Parece que a sobrevivência do gosto pela literatura tem dependido de milagres aleatórios que são cada vez menos frequentes.

Vendem-se, nas livrarias, livros com resumos das obras literárias que saem nos exames. Quem aprende resumos de obras literárias para passar, aprende mais do que isso: aprende a odiar a literatura.

Sonho com o dia em que as crianças que lêem os meus livrinhos não terão de analisar dígrafos e encontros consonantais e em que o conhecimento das obras literárias não seja objecto de exames: os livros serão lidos pelo simples prazer da leitura.

Retirado do blog  Leitura

quinta-feira, 5 de maio de 2011

domingo, 1 de maio de 2011

Amigos e Leituras: Dois anos de Leitores Amigos

Eunícia sempre comenta sobre como é bom rirmos em conjunto. Seja pessoalmente ou virtualmente. Rir é o tipo de coisa boa de fazer com alguém. Como quando você é atingido por uma crise de riso junto com aquela amiga que faz com qualquer minúsculo gesto se torne o mais engraçado do mundo. Clarissa com alguma freqüência lê ao meu lado. Estudamos temas diferentes, em períodos diferentes, com focos diferentes, e mesmo assim, caminhamos juntas. Pois é possível ler em conjunto distintas configurações textuais. Roberta constantemente se aventura comigo pela desventura ou peripécia da vida. Ela me conta sobre o cotidiano, sobre ser mãe, esposa, historiadora e etc. Sobre um mundo que eu ainda não leio. Apesar da minha ignorância e imaturidade, ela me convida para partilhar sua leitura. Rafael Serafim diverte-nos a todos com a sua perspectiva tresloucada do mundo. Mesmo as coisas mais absurdas vem acrescidas da possibilidade de rirmos em conjunto – coisa que a Eunícia nos lembra que é fundamental. Luaninha com constância me ensina a ler um mundo cru. Livra-me da ingenuidade insistente com que caminho. Mas neste trajeto, escolhe sempre uma poesia para me embalar e para não deixar meu coração endurecer. Rômulo – um dos muitos autores fantasmas deste blog – consegue me ensinar sobre as leituras fabulosas que fazemos quando nos entregamos por completo ao nosso objetivo. Rafael Gota faz com as risadas aumentem, cresçam em volume e freqüência. Ler o mundo ao seu lado é sempre mais divertido. Felipe tem um jeito especial de me convidar para ler o mundo de mãos dadas. (e ao lado dele o mundo sempre me parece mais belo). Em certo post – no primeiro ano do blog – Eunícia mostrou as gavetas de Clarice que ficaram em exposição no CCBB. Estamos descobrindo o mundo e novas leituras, encontrando outras gavetas. É tão bom fazer isso em conjunto... Parabéns Leitores Amigos, pelo segundo ano do nosso Blog. É um prazer ler ao lado de vocês. Eunícia tem razão, certas coisas são melhores conjugadas.