"Cada libro, cada tomo que ves tiene alma. El alma de quien lo escribió y el alma de quienes lo leyeron y vivieron y soñaron con el (...) Los libros son espejos: sólo se ven en ellos lo que uno ya lleva dentro"

(Carlos Ruiz Zafón, La sombra del viento)

sábado, 22 de maio de 2010

Sofá de Alice


Não é para ler, mas para recostar. Achei a cara de Alice, então, como ela visita sempre o nosso blog, resolvi postá-lo para ela ter onde descansar...

quinta-feira, 20 de maio de 2010

terça-feira, 18 de maio de 2010

O olhar do fótografo

Robert Doisneau.
Para lembrarmos que lemos mais que palavras E que toda leitura é representação.

Ana Maria Machado e a palavra mágica...

Entrei em contato com esse texto de Ana Maria Machado no  segundo ano do ensino médio e nunca consegui esquecer do que senti quando o li pela primeira vez. Lamento ter tido que transcrever todo e criar com isso um enorme post, mas ele não está em nenhum lugar da internet. 
Em nome do amor pelas palavras e pela leitura trago o texto exatamente como está na minha folha de redação do segundo ano. 
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PALAVRA MÁGICA: TULUTATULÊ
Ana Maria Machado

Além da dor de perder alguém muito precioso, com a morte de Paulo Freire me veio também à lembrança o momento em que pela primeira vez ouvi falar dele e trabalhei diretamente com o método que criou. Foi pouco antes do golpe de 1964. O ministro da Educação de Base era Paulo de Tarso, eu era estudante e, como tantos outros, participava do Movimento de Educação de Base, para alfabetizar adultos pelo método Paulo Freire. Fiz o curso para conhecer e aprender algo da pedagogia do oprimido (nem sei se já tinha esse nome) que ele propunha. Fiquei conhecendo a experiência em Angicos, o sistema de se trabalhar com palavras ligadas à realidade dos alunos, e a importância de, com eles, distinguir natureza e cultura no mundo em volta, valorizando a ação humana e enfatizando a própria criação de quem estava se alfabetizando. Depois fui dar aulas para operários num prédio em construção em Copacabana, na rua Miguel Lemos. Apresentada a primeira palavra, tijolo (a segunda seria uma expressão, moda de viola, já que entre os alunos havia um animado violeiro) começamos a dividi-la em sílabas e explorar suas possibilidades. 
Mas eu não imaginava como seriam infinitas. De repente, um aluno escreveu uma longa palavra esquisita, parecendo palavra mágica: Tu Luta, Tu Lê. Levei um susto. Não só com a emoção de ver como era rápido, como ele era capaz de criar de imediato um uso impessoal e coletivo para o único pronome capaz de escrever no momento... mas também pela ordem que deu ao seu pensamento. Não se trava de ler para poder lutar, como propunha meu coração de vinte anos, mas de lutar para conseguir ler. A leitura era o objetivo, a meta. A luta era só o meio de chegar lá. 
Nas aulas seguintes, tentamos ir mais longe nessa idéia. Em pouco tempo, na exatidão econômica de suas parcas sílabas, eles explicaram porque esse objetivo era tão precioso: Tu lê, tu já não tem medo. 
Nenhum ensaio que eu tenha lido depois, pelos anos afora, deu conta do recado tão bem, explicando como a dominação se utiliza da falta da leitura. 
Outra emocionante experiência com a palavra, em outro contexto, completa para mim essa função libertária da linguagem, da escrita, da leitura.  É a de Gianni Rodari, na Itália, durante a Segunda Guerra. Jornalista, militando resistência, em certo momento Rodari foi enviado para o interior, por questões de segurança. Começou a trabalhar nas aldeias lutando com sua arma, a palavra. Primeiro, contando histórias para crianças. Depois, para adultos também. Em seguida, estimulando-os a inventar suas próprias histórias. A revoluçÃo que isso causou em suas vidas e as consequências políticas vindas dessa intimidade com a narrativa podem ser acompanhadas em livro, editado em português pela Summus, GRAMÁTICA DA FANTASIA. Em resumo, Rodari concluiu com uma fórmula cristalina: é indispensável que todos façam uso da palavra e tenham acesso a todos os seus usos, não para que todos sejam artistas, mas para que ninguém seja escravo. 
No momento como o que vivemos, casa vez mais a tendência é oposta, de não criar suas próprias histórias, não ordenar os próprios pensamentos e se limitar a repetir slogans, chavões e palavras de ordem. (...)
A palavra liberta. A leitura dá argumentos para não deixar intimidar. Lembrar-se disso - e procurar por em prática - é uma bela homenagem que se poderia prestar a Paulo Freire.

(Ana Maria MACHADO. Contracorrente: Conversas sobre leitura e política. São Paulo: Ática, 1999. P.123)

segunda-feira, 17 de maio de 2010

domingo, 16 de maio de 2010

Notícia sincera para futuros livreiros

Jaime Bulhosa, livreiro luso conhecido nosso, foi entrevistado pela revista ALICE. Em meio à espirituosa entrevista - como é o personagem que lemos no blog - o entrevistado responde à pergunta 'Qual o preço dessa independência?': "Ganhar menos dinheiro e trabalhar com mais dificuldades." A entrevista inteira (com lindas fotos da livraria) pode ser lida aqui.

quinta-feira, 13 de maio de 2010

sábado, 8 de maio de 2010

Cheiro de velho, gosto de novo

Recentemente fui acusada de gastar muito dinheiro com livros. Existe verdade nesta afirmação. Acho que eu sou meio viciada em livros. E o que é pior, tenho o péssimo costume de ler os livros que compro. 
Hoje, eu voltava da UERJ depois de um seminário e ao chegar na praça Saens Peña eu escolhi voltar a pé e guardar o dinheiro que eu poderia usar para pegar outra condução até mais perto de casa. O dinheiro não ficou muito tempo na minha carteira. Entrei em um sebo no caminho de casa, contei o dinheiro, comprei um livro de poesia. Estava há muito tempo querendo voltar a ler Cecília Meireles, mas a necessidade de priorizar outros livros não havia me permitido ainda entrar em uma livraria e sair com alguma obra dela. Já explicitei em outro momento que ela é uma das minhas favoritas. 
Comecei a ler meu velho livro novo. Resolvi compartilhar um dos poemas. 
Pensei na Eunícia quando li este, e na compulsão que ela diz ter por palavras. 


Vôo


A Darcy Damasceno


Alheias e nossas
as palavras voam.
Bando de borboletas multicores,
as palavras voam.
Bando azul de andorinhas,
bando de gaivotas brancas.
as palavras voam.
Voam as palavras
como águias imensas
Como escuros morcegos
como negros abutres,
as palavras voam.

Oh! alto e baixo
em circulos e retas
acima de nós, em redor de nós
as palavras voam

E às vezes pousam

Cecília Meireles 


(MEIRELES, Cecília. "Vôo" In: poesias completas de cecília meireles. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979. )

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Presente de vó



Muito bem. As postagens estão atrasadas, mas é preciso fazer menção ao meu presente de aniversário. 

Minha avó querida me deixou a vontade para escolher um presente, como em geral faz e eu escolhi o livro que tanto queria desde que vi o lançamento. Descobri uma promoção na Travessa online, e então, eu e a vovó aproveitamos. 
Sinto que é necessário fazer menção ao atendimento fantástico da Travessa online. Escolhemos a forma de pagamento mais demorada mesmo quando paga pela internet, boleto/débito em conta. Mesmo assim, a confirmação do pagamento foi feita no dia seguinte e no mesmo dia o livro foi embalado e postado. Recebi o livro em pouco menos de dois dias, o que já é surpreendente, ainda mais se levarmos em consideração que o pagamento foi feito por volta de 22hs. O livro veio muito bem embalado. Sem amassados, sem orelhas, sem defeitos. 

terça-feira, 4 de maio de 2010

Implacável

Segundo o dicionário implacável é aquele que não se deixa aplacar. Como alguém que não desiste, que luta por um alvo.  A grafia correta contém um "m" antes do "p" e assim seria se existisse um "b". Antes de "p" ou "b" só pode vir "m". Ela termina com "L", mas no início do movimento de alfabetização o som de "u" no final da palavra faz com que muitas crianças se confundam na grafia.
Grande parte das pessoas podem contar sobre pelo menos um bom professor que marcou de forma significativa e positiva a vida delas. Eu posso.
Para algumas pessoas, como é o meu caso, foi a esperança de um professor que transformou notas ruins em boas notas. Afinal, existem alguns que são ruins em matemática, não conseguem ler direito e tem dificuldade de se relacionar com as pessoas. Depois de ouvir tantas vezes que se é burra, é bom ver o sorriso nos olhos de um professor que acredita em um potencial que até aquele momento parecia inexistente. Descobre-se por fim que um bom par de óculos faz maravilhas, mas é preciso que exista um professor atento para perceber que tem uma aluna de cabelo preso no final da sala que não consegue enxergar o quadro.
Professores assim me fizeram querer ser professora.
Recentemente fui ao cinema assistir o belo filme "Preciosa" baseado em um livro de mesmo nome na tradução para o português. O filme é um elogio à esperança, ao suor e à luta. Esperança não pode subtrair a luta implacável pelo que se deseja, sonha ou espera. Preciosa é uma dessas pessoas que pensou muitas vezes em desistir, pesou a vida e percebeu que seria mais feliz se estivesse morta, então encontrou alguém que lhe mostrou que ela poderia ser mais do que um erro e que a esperança que ela buscava só seria alcançada quando ela lutasse. No caso do filme a luta vem através da escrita. É nesse momento que ela vai perceber que pode ser mais do que a filha que deveria ter sido abortada, como sua mãe faz questão de repetir. Ela pode superar o corpo que lhe incomoda, a imagem refletida no espelho que a acusa. Preciosa passa a existir para si através da palavra, a escrita, a leitura.
E através dessas ferramentas ela escolhe viver e transmitir vida para seus filhos.
Professores ainda me inspiram, e histórias como a que Sapphire conta ainda me motivam. Vou ler o livro e estou certa de que me emocionarei novamente. A esperança me emociona, a luta implacável por ela me traz lágrimas aos olhos, pois a vida é realmente preciosa.

Ivan Angelo - Ladrão de Sonhos

Andando pela internet encontrei um texto de que gosto muito desde que o conheci no terceiro ano. Ivan Ângelo no livro Ladrão de Sonhos e outras histórias. Para os leitores notívagos, ei-lo:
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VAI

Quer ir? Vai. Eu não vou segurar. Uma coisa que não dá certo é segurar uma pessoa contra a vontade, apelar pro lado emocional. De um jeito ou de outro isso vira contra a gente mais tarde: não fui porque você não deixou, ou: não fui porque você chorou. Sabe, existem umas harmonias em que é bom a gente não mexer. Estraga a música. Tem a hora dos violinos e tem a hora dos tambores.
Eu compreendo, compreendo perfeitamente. Olha, e até admito: você muda pra melhor. Fora de brincadeira, acho mesmo. Eu sei das minhas limitações, pensei muito nisso quando tava tentando te entender. É, é um defeito meu, considerar as pessoas em primeiro lugar. Concordo. Mas não tem mais jeito, eu sou assim. Paciência.
Sabe por que eu digo que você muda pra melhor? Ele faz tanta coisa melhor do que eu! Verdade. Tanta coisa que eu não aprendi por falta de tempo, de oportunidade – ora, pra que ficar me justificando? Não aprendi por falta de jeito, de talento, essa é que é a verdade. Eu sei ver as qualidades de uma pessoa, mesmo quando é um homem que vai roubar minha namorada. Roubar não: ganhar.
Compara. Ele dança muito bem, até chama a atenção. Campeão de natação, anda de bicicleta como um acrobata de circo, é bom de moto, sabe atirar, é fera no volante, caça e acha, monta a cavalo, mete o braço, pesca, veleja, mergulha... Não tem companhia melhor.
Eu danço mal, você sabe. Não consegui ultrapassar aquela fronteira larga entre a timidez e a ousadia, entre a discrição e o exibicionismo, que separa o mau e o bom bailarinos. Nunca fui muito além daquela fase em que uma amiga compadecida precisava sussurrar no meu ouvido:dois pra lá, dois pra cá.
Atravessar uma piscina eu atravesso, uma vez, duas talvez, mas três? Menino de cidade, e modesto, não tive córrego nem piscina. É com olhos invejosos que eu o vejo na água, afiado como se tivesse escamas.
Moto? Meu Deus, quem sou eu. Pra ser bom nisso é preciso ter aquele ar de quem vai passar roncando na frente ou por cima de todo mundo – e esse ar ele tem.
Montar? É preciso ter essa certeza, que ele tem, de que cavalo foi feito pra ser domado, arreado, freado, ferrado e montado. Eu não tenho. Não tá em mim. Eu ia montar como se pedisse desculpas ao cavalo pelo incômodo, e isso não dá, não pode dar um bom cavaleiro.
O jeito como ele dirige um carro é humilhante. Já viajei com ele, encolhido e maravilhado. Você conhece o jeitão, essa coisa da velocidade. Não vou ter nunca aquela noção de tempo, a decisão, o domínio que ele tem. Cada um na sua. Eu troquei a volúpia de chegar rapidinho pelo prazer de estar a caminho. No amor também.
Caçar... Dar um tiro num bicho... Ele tem isso, a certeza de que o homem é o senhor do universo, tudo tá aí pra ele. Quem me dera. Quando penso naquela pelota quente de aço entrando no corpo do bicho, rasgando carne, quebrando ossos... Não, não tenho coragem.
Aí é que eu tou perdido mesmo, no capítulo da coragem. Ele faz e acontece, já vi. Mas eu? Quantas vezes já levei desaforo pra casa. Levei e levo. Se um cachorro late pra mim na rua, vou lá e mordo ele? Eu não. Mudo de calçada.
Outra coisa: ele é mais engraçado do que eu. Fala mais alto, ri mais à vontade, às vezes chama até um pouco a atenção mas... é da idade. Lembra aquela vez que ele levou um urubu e soltou na igreja no casamento do Carlinhos? E aquela vez que ele sujou de cocô de cachorro as maçanetas dos carros estacionados na porta da boate’? Lembra que sucesso? Os jornais falaram por dias naquilo. Não consigo ser engraçado assim. Não tá em mim. Por isso que eu não tenho mágoa. Ele é muito mais divertido. E mais bonito também.
Vai.
Olha, não quero dizer que o que eu vou falar agora tenha importância pra você, que possa ter influído na sua decisão, mas ele tem mais dinheiro também, você sabe. Ele tem até, sabe?, aquele ar corajoso dos ricos, aquela confiança de entrar nos lugares. Eu não. Muito cristal me intimida. Os meus lugares são uns escondidos onde o garçom é amigo, o dono me confessa segredos, o cozinheiro acena lá do quadradinho e me reserva o melhor naco. É mais caloroso, mas não compensa o brilho, de jeito nenhum.
Ele é moderno, decidido. Num restaurante não te oferece primeiro a cadeira, não observa se você tá servida, não oferece mais vinho. Combina, não é?, com um tipo de feminismo. A mulher que se sente, peça o que quiser, sirva-se, chame o garçom quando precisar. Também não procura saber se você tá satisfeita. Eu sei que é assim que se usa agora. Até no amor. Já eu sou meio antigo, ultrapassado, gosto de umas cortesias.
Também não vou dizer que ele é melhor do que eu em tudo. Isso não. Eu sei por exemplo uns poemas de cor. Li alguns livros, sei fazer papagaio de papel, posso cozinhar uns dois ou três pratos com categoria, tenho certa paciência pra ouvir, sei uma ótima massagem pra dor nas costas, mastigo de boca fechada, levo jeito com crianças, conheço umas orquídeas, tenho facilidade pra descobrir onde colocar umas carícias, minhas camisas são lindas, sei umas coisas de cinema, não bato em mulher.
E não sou rancoroso. Leva a chave para o caso de querer voltar.


(ÂNGELO, Ivan. "Vai" In: Ladrão De Sonhos e outras histórias. São Paulo: Editora Ática, 1995)