"Cada libro, cada tomo que ves tiene alma. El alma de quien lo escribió y el alma de quienes lo leyeron y vivieron y soñaron con el (...) Los libros son espejos: sólo se ven en ellos lo que uno ya lleva dentro"

(Carlos Ruiz Zafón, La sombra del viento)

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Descoberta Recente

Recebi de presente em amigo oculto recente o Caderno de Sonetos de Tite de Lemos. Não conhecia o poeta ou a beleza de seus escritos. Compartilho com outros da mesma forma que compartilharam comigo.

I

A sombra o longo pátio visitava
e a sombra me assombrava. Ainda assombra
Porque brilhava o sol havia sombra
como um senhor carrega sua escrava


Não sei se sonho agora ou se sonhava:
na paisagem que vejo ainda há sombra
e a sombra que lá baila, ao léu, me assombra
a alma covarde num papel de brava


As maçãs me fugiram pelos dedos
com as águas de rápidos regatos
que passaram mais eu não vi passar


A tarde vem tecer velhos enredos.
Costura e recostura antigos fatos
como se a vida fosse algum tear. 

domingo, 19 de dezembro de 2010

Encontro na Livraria

Moro em uma casa cheia de leitores, portanto, sair e ir à livraria é sempre uma festa. Hoje fomos celebrar a vida - como em geral fazemos - e comprar o meu presente de natal, na livraria. Enquanto procurava presentes para outras pessoas encontrei com uma professora da faculdade, a mesma que indicou-me a leitura do Mia Couto. Em poucos minutos paradas em frente a mesma estante ela me indicou três autores diferentes e ofereceu algumas dicas interessantes para presentes, algumas eu me darei de presente e outras darei aos meus amigos que faltam se presenteados.
Quando saí da livraria fiquei pensando sobre como pode ser divertido encontrar nas livrarias alguém que lê bastante coisas completamente diferentes daquilo que você lê. Essa mistura de leituras é algo tão delicioso e é o que torna esse blog tão querido. Esta é a segunda virada de ano do Leitores Amigos e o encontro com minha professora me lembrou dos nossos encontros e misturas virtuais de leituras diversas e multifacetadas de muitos autores e também da própria vida.
Que venham novos encontros e reencontros...

sábado, 18 de dezembro de 2010

Le Petit Nicolas: uma nova alfabetização


Eu me lembro ainda da descoberta que vivi quando aprendi a ler pela primeira vez. E agora, aprendendo a ler pela terceira vez, a descoberta continua sendo deliciosa. Como parte das atividades e projetos do semestre minha turma e eu lemos o primeiro livro da parceria de Sempé e Goscinny, Le Petit Nicolas. O livro que foi recentemente adaptado para as telas do cinema é simplesmete maravilhoso. Gargalhei diversas vezes ao ler o livro, o primeiro que li em francês. Assisti o filme no cinema e devo admitir que não sei como não me engasguei com toda aquela pipoca enquanto chorava de rir assistindo o filme. Lembrei-me muito de mim mesma e da minha infância lendo o livro e vendo o filme, pois eu era - como o pequeno Nicolas - muito levada e sapeca, sempre acabava dentro das maiores confusões e aventuras na companhia dos meus melhores amigos. 
Ouvir e compreender o francês oral é certamente fantástico, porém, ser capaz de ler um livro é simplesmente magnífico. O melhor é me surpreender de novo, passar pelo espanto inicial do qual Pessoa fala, como se estivesse sendo alfabetizada pela primeira vez. :)
Para os que não leram o livro aviso que grande parte das histórias já foi traduzida para o português. Além disso, se houver oportunidade, assistam o filme, livro e filme são maravilhosos!

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Acender-se


Imagem por Will Washford


"Eis que aprendi
Nesses vales onde afundam os poentes:

Afinal, tudo são luzes
E a gente se acende é nos outros.
A vida é um fogo,
Nós somos suas breves incandescências."

Mia Couto. 
"Um rio chamado tempo, uma casa chamada Terra"


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Alguns livros continuam falando com a gente mesmo depois de muito tempo...

sábado, 11 de dezembro de 2010

'Com as palavras lavamos nossas vidas'

Imagem por Will Washford

“Em carta de 1948, Graciliano Ramos compara o trabalho do escrito à rotina das lavadeiras. Fala das velhas lavadeiras alagoanas quem inclinadas sobre a água, em um ritual hipnótico, dão uma primeira lavada em suas roupas, torcem-nas, molham novamente, voltam a torcer, em um teatro sem fim. Só depois, elas mergulham a roupa no anil e, enfim, a ensaboam. Mas tudo recomeça. Diz Graciliano: “Batem o pano na laje ou na pedra limpa, e dão mais uma torcida e mais outra, torcem até não pingar do pano uma só gota”. Da repetição interminável, arrancam a existência.
             As palavras de Graciliano me chegam em outra carta, despachada do Recife pelo escritor Fernando Monteiro. Eu uso, agora, como um marcador de páginas enquanto leio “O senhor vai entender” (Companhia das Letras, tradução de Maurício Santana Dias), novela do italiano Claudio Magris. A carta de meu amigo contém outra idéia de Graciliano; “A palavra não foi feita para enfeitar, brilhar como ouro falso; a palavra foi feita para dizer”. Embaralhando os dois pensamentos, arrisco-me a pensar: com as palavras, lavamos nossas vidas."
(José Castello. “Magris no elevador” (Fragmento). Caderno prosa e verso. O Globo.)

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Enquanto escrevo o artigo de cada semestre lembrei-me deste fragmento que me foi apresentado pelo professor Ilmar Mattos em aula, foi uma das epígrafes do curso de LEAH (Laboratório de Ensino e Aprendizagem em História). Compartilho com os leitores amigos então, não apenas pela beleza que o fragmento contém, mas também pela angústia que me passa graças aos diversos momentos em que meu esmero com a escrita deixa muito a desejar. 

"I wait on every word"


Tirei o lindo desenho daqui

domingo, 28 de novembro de 2010

Em meio aos livros


Tirei a imagem daqui, foi uma indicação da leitora amiga Eunícia.

É uma delícia deitar-se imerso em livros, não?


sábado, 20 de novembro de 2010

Descobrindo palavras

Eu estava preparando uma postagem diferente, mas a imobilização da mão direita me forçou a parar no meio.
Em pleno sábado de manhã estava a passear pela internet quando lembrei que uma amiga comentou sobre o blog da editora Bruaá. Fui até lá investigar e encontrei este belo poema.
Quem quiser conhecer todo o blog clique aqui
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A Cidade


A cidade é um chão de palavras pisadas
a palavra criança a palavra segredo.
A cidade é um céu de palavras paradas
a palavra distância e a palavra medo.

A cidade é um saco um pulmão que respira
pela palavra água pela palavra brisa
A cidade é um poro um corpo que transpira
pela palavra sangue pela palavra ira.

A cidade tem praças de palavras abertas
como estátuas mandadas apear.
A cidade tem ruas de palavras desertas
como jardins mandados arrancar.

A palavra sarcasmo é uma rosa rubra.
A palavra silêncio é uma rosa chá.
Não há céu de palavras que a cidade não cubra
não há rua de sons que a palavra não corra
à procura da sombra de uma luz que não há.

Ary dos Santos

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Lançamento


Chegou ao Brasil o livro em que Ingrid Bittencourt conta sobre o tempo em que viveu como refém da Farc. O livro que se chama "Não há silêncio que não termine" foi lançado pela companhia das letras e a autora foi entrevistada pelo Globo.com enquanto está na Brasil para promover o livro. Extraí um trecho que me falou bastante. Leia a entrevista na íntegra aqui
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"Lembro quando estava presa em uma árvore – e foi um momento muito preciso porque lembro que estava chovendo – e havia pedido ao comandante que me deixasse ficar na barraca com meus companheiros, e ele não me autorizou. Eu tinha pedido que me soltasse para ir ao banheiro e ele me olhou feio e disse: ‘faça aí, na minha frente ‘. Nesse momento eu pensei ‘perdi tudo’, meus filhos, minha vida, minha mãe. Meu pai que estava morto parecia estar mais perto de mim do que todos os demais.
[...] Mas depois pensei ‘não, não tinha perdido tudo’. Havia algo que eu não tinha perdido, e era a decisão que podia tomar de dizer que tipo de pessoa eu quero ser. E eu não quero ser como eles. Não quero ser uma pessoa que mata outro para obter a liberdade, não quero ser alguém que odeia, não quero ser uma pessoa que saia da selva, se um dia sair, com rancor, sede de vingança. Pensei: eu posso definir isso.
E hoje em dia, quando tenho a liberdade de tudo, sigo sentindo que o mais importante é isso. E essa liberdade de definir quem se quer ser é uma liberdade que não se dá nas grandes decisões da vida, mas nos pequenos detalhes, em cada momento. Na maneira como uma pessoa dispõe de seu tempo. Porque acredito que o maior presente que uma pessoa pode dar a outra é seu tempo. Então é no amor que se coloca nas relações com os demais, no trato com os demais. Enfim, não acho que uma pessoa seja capaz de mudar o mundo, mas é possível mudar o próprio mundo, o seu interior, e quando mudamos o nosso interior, estamos mudando o mundo."

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Maggs Rare books


Há quem diga que a visita em si já vale tudo. Eu não sei, não pude esticar até lá quando estive em Londres. Não faltou vontade. Maggs Rare Books é mais do que um sebo, é um antiquário cheio de preciosidades autografadas e raras. Essa foto é de uma série de fotografias tiradas lá. Inclusive conheci a Maggs através desta série de fotos que foi apresentada pelos amigos da Pó dos livros
Para conhecer melhor o lugar entre no site da Maggs Bros

terça-feira, 26 de outubro de 2010

Persépolis

Neste mundo de HQs existem outros títulos de que gosto especialmente além de MAUS, do qual falei no último post. Marjane Satrapi é uma iraniana que fez sua autobiografia em formato de HQs. O livro que foi divido em quatro volumes e depois transformado em um só, fala desde sua infância e adolescência até sua vida adulta. Através de sua biografia, Satrapi aborda a história do Irã e mostra como foi fortemente influenciada pelo contexto político que viveu em seu país. Durante sua estadia na europa a questão das identidades se tornam um tema recorrente, como se identificar, se os iranianos são acusados constantemente de serem terroristas?
O tema da mulher entra em cena conforme a personagem, a própria autora, cresce. Que tipo de mulher ser, a iraniana ou a européia? Cabe a ela esta escolha?
Existem os preconceitos diversos que ela acaba sofrendo e que ela também demonstra em outros momentos. O choque entre sua cultura e a cultura européia.
O livro é complexo, afinal a vida está imersa em complexidades e complicações. As relações familiares estão cheias de tensão, o amor é um espaço de muitos conflitos. A avó que é uma mulher especialmente forte - de quem Marjane gosta especialmente e por quem nutre enorme admiração, os pais que são incrivelmente amorosos -inclusive a autora faz uma nota especial agradecendo a compreensão e o amor dos pais, e existe esse outro personagem, um governo que tantas vezes seca os amores ou pelo menos dificulta-os. Além disso, existe a inevitável e bem-vinda mudança, que ora nos aproxima, ora nos afasta daqueles que tanto amamos e que também  nos amam.

No meio disso tudo estoura uma guerra, alguns amigos se perdem, outros saem do conflito com sequelas permanentes e como a própria autora escreve, o tempo se encarrega de aproximá-la de seus antigos amigos e depois de separá-la. Todos esses temas acabam sendo abarcados pela biografia desenhada de Marjane Satrapi. O tom do livro ainda que por vezes seja dramático e duro, não desperdiça os momentos de bom humor e alegria, nem perde as oportunidades que lhe são concedidas para o riso, acredito que em alguns momento a vida funciona da mesma forma.

domingo, 24 de outubro de 2010

MAUS


"A exigência de que Auschwitz não se repita
é a primeira de todas para a educação (...)
Ela foi a barbárie contra a qual se dirige
toda a educação."
(Theodor Adorno, Educação após Auschwitz)


Eu sempre gostei de HQs. É de família, aprendi com meu pai. Mesmo assim, pensei durante muito tempo que quadrinhos era algo que servia-me apenas como divertimento. Quando cheguei ao segundo ano do ensino médio conheci um professor de história que acreditava - e ainda acredita - que nós aprendemos mais e melhor quando nos divertimos. Então, no momento de estudarmos a Segunda Guerra Mundial ele sugeriu um trabalho a partir da leitura de MAUS, uma história em quadrinhos sobre o holocausto. Art Spiegelman é o único autor de histórias em quadrinhos que foi premiado com o Pulitzer. Seu livro MAUS é o único livro de histórias em quadrinhos que recebeu esse prêmio. Em sua obra ele conta a história de seu pai Vladek e sua mãe Anja, ambos sobreviventes do holocausto. A história é contada segundo a visão do pai, mas Art - ou Artie, como é chamado pelo pai - aparece em muitos momentos que retratam as várias visitas e entrevistas que ele fez com seu pai para desenhar o livro. MAUS é uma história do tipo FORTE - em letras garrafais. Não estamos falando de história em quadrinhos que visa apenas entreter. Chorei lendo na primeira vez, e na segunda, na terceira...
Spiegelman desenhou os judeus como ratos, os alemães são gatos, os polonesês são retratados como porcos - certamente encontramos o elemento risível nas representações - e os americanos são cães. No entanto, vale ressaltar, estamos falando de ratos incrivelmente humanos. Acredito que a representação escolhida permite ao autor criticar, mas, surpreendente, torna o livro ainda mais forte. Emociona-me toda vez que leio. Meu professor tinha razão, a questão do holocausto ficou gravada em mim de tal forma que nenhuma aula - por melhor e mais completa que fosse -  jamais poderia alcançar tamanho sucesso. MAUS é um belo livro, um testemunho comovente certamente, mas é também um manifesto contra a barbárie, contra o horror vivido por tantos homens e mulheres que, durante um triste período da história da humanidade, foram reduzidos à condição de ratos.

sábado, 23 de outubro de 2010

Sobre fracassos

Na semana do dia das crianças eu dei uma passada no blog da Companhia das Letras e por um acaso eles tinham uma lista de livros interessantes para crianças e jovens. Li muitos elogios ao trabalho de Jules Feiffer, e a capa do livro foi escrita por Art Spiegelman, autor e desenhista que eu particularmente admiro muito. O livro O Homem no Teto escrito e ilustrado por Jules Feiffer é ainda melhor do que eu esperava. Jimmy, o protagonista da história, tem uns dez anos e meio, não fala muito, não tem tantos amigos assim, não joga beisebol e não se esforça muito na escola. Tem uma irmã que grita com ele o tempo todo e outra que quer sempre sua atenção. Jimmy é um desenhista de história em quadrinhos que conhece muito bem o significado da palavra fracasso. Jimmy não é o popular super-herói dono de seu próprio nariz, ele é um menino inseguro que muitas vezes desiste de seus sonhos para tentar ganhar a afeição e admiração dos outros. Este não é um livro com uma história extraordinária cheia de coisas grandiosas e distantes da realidade. É uma história para os jovens Jimmys que existem aos montes. Livro para meninas como eu, que era uma dessas pessoas sem muitos amigos mas repleta de fracassos. Emocionei-me com o livro, isso significa que ri bastante - afinal é um livro cheio de bom humor - mas também chorei um pouquinho quando percebi como éramos parecidos, eu e Jimmy. Fizemos uma boa descoberta, fracassar não é nossa deixa para desistir, mas para continuar. "É preciso caminhar antes de correr".  O livro conta o cotidiano de um menino que luta pelo sucesso e ao fim descobrimos, eu e ele - ambos com lágrimas nos olhos -, que passamos pelo fracasso muitas vezes antes de descobrir o sucesso. E então nos sentimos em casa, continuaremos caminhando...

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Uma coisa puxa a outra



"SOME DAY YOU WILL BE OLD ENOUGH TO START READING FAIRY TALES AGAIN." 
C.S. LEWIS

Andando pela internet conheci este blog sobre ilustrações infantis escrito por um inglês.

Children's / Fantasy Illustration

E através deste blog cheguei a outro - viva a teia ou web -, escrito em inglês por uma holandesa.

Love For Books

Os dois são muito divertidos. :)

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Um livro infantil e sua bela metáfora

Você sabia que os pássaros são um dos tipos de animais que melhor cuidam de seus filhotes? Eu não sabia que disso, mas Jackie Corvo sabia. Ele não poderia escolher ser nenhum animal que não cuidasse bem de seus pequeninos, ele amava Lizzie demais. No início ela não conseguia compreender o que se passava na cabeça de seu pai, por que ele tinha inventado de ser pássaro, ou melhor, homem-pássaro. Ela se preocupava com seu pai.  Lizzie demorou para perceber que mesmo como pássaro seu pai tinha escolhido cuidar dela da melhor forma possível. Quando ela percebeu esse amor do pai ela parou de ouvir tudo que lhe dizia que tinha algo de errado com seu pai, embarcou com ele na aventura. Criaram então um ninho, construíram outro par de asas e sonharam sonhos de passarinhos.
"Meu pai é um homem-pássaro" é um livro formidável escrito por David Almond e ilustrado lindamente por Polly Dunbar. Chamou minha atenção o título e a crítica. Certamente foi escrito para crianças - as mais velhas, pois é um pouquinho grande - e a história, que tem seu início cheio da tristeza e da solidão de um pai viúvo, chega ao fim com a alegria  que o amor inexplicável entre pai e filha tem poder de trazer. A tristeza aparente da história não se concretiza, inclusive a ilustradora utilizou muitas cores, fez desenhos muito alegres e divertidos. Durante a história devo admitir que derramei uma ou duas lágrimas discretas. Pensei em como eu e meu pai costumávamos entrar um na imaginação do outro, vivenciando juntos algumas belas aventuras, como Lizzie faz com seu pai ao descobrir que ela não é apenas Lizzie, ela é Elizabeth Corvo. A diferença entre Elizabeth e seu pai diminuiu e a distância desistiu transformando-se em estrada para um belo reencontrar-se, um na imaginação do outro. O diferente e estranho tornou-se menos importante quando Lizzie e o pai perceberam quanto eles se amavam e então nada mais era mais importante do que estarem juntos. Tem jeito mais alegre de terminar o livro? Bem, tem como completar a alegria, mas não vou contar o final...

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Poesia musicada



Vento no Litoral 
 Renato Russo


De tarde quero descansar

Chegar até a praia e ver
Se o vento ainda esta forte
E vai ser bom subir nas pedras

Sei que faço isso pra esquecer

Eu deixo a onda me acertar
E o vento vai levando
Tudo embora...

Agora está tão longe

ver a linha do horizonte me distrai
Dos nossos planos é que tenho mais saudade
Quando olhávamos juntos
Na mesma direção
Aonde está você agora
Alem de aqui dentro de mim...

Agimos certo sem querer

Foi só o tempo que errou
Vai ser difícil sem você
Porque você esta comigo
O tempo todo
E quando vejo o mar
Existe algo que diz
Que a vida continua
E se entregar é uma bobagem...

Já que você não está aqui

O que posso fazer
É cuidar de mim
Quero ser feliz ao menos,
Lembra que o plano
Era ficarmos bem...

Eieieieiei!

Olha só o que eu achei
Humrun
Cavalos-marinhos...

Sei que faço isso

Pra esquecer
Eu deixo a onda me acertar
E o vento vai levando
Tudo embora...

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Livro - André Neves

André Neves escreve e desenha poesias. 


Livro
"Quando estamos assim, 
JUNTINHOS,
em companhia um do outro. 
Sinto-me realmente grato 
ao bem que você me faz."
André Neves


Para ler o blog do André clique aqui




terça-feira, 7 de setembro de 2010

Leitura de feriado

Muito na vida é vencer preconceitos.
Como já mencionei em uma postagem anterior, que agora me parece muito antiga, conheci Dan Brown quase por acaso. Em um dia de férias no qual tinha absolutamente nada para fazer, me deparei com um de seus livros - Anjos e demônios - na estante e resolvi me aventurar. Apesar de certa implicância com os modismos, sentimento, aliás, que parece de certo modo já bem difundido, gostei da leitura. Uma história envolvente, muito bem contada e elaborada. Resolvi, então, que em algum momento venceria um verdadeiro preconceito e leria seu mais famoso livro: O código Da Vinci. Assim fiz neste feriado enorme e entediante.

Devo dizer que para um cristão - o meu caso - O código Da Vinci é uma leitura difícil e, por vezes, desagradável. Dan Brown conta uma segunda versão bem elaborada e bastante convincente de Jesus Cristo. Não sei até onde esta sua versão realmente existe e até onde é pura invenção do autor. Quero dizer: não sei em que Brown se baseia para narrar sua história. Basicamente, o autor diz que tudo o que o cristianismo prega como verdade é uma farsa forjada logo em seus primórdios por homens interessados em proteger e expandir o poder terreno da Igreja Romana.

Então aviso: se você é um cristão do tipo que se escandaliza com facilidade, não recomendo a leitura. Honestamente, o que me incomoda em O código Da Vinci não é o suposto casamento de Cristo com Maria Madalena já que o casamento não é pecado. Muito pelo contrário, é uma instituição divina. Portanto, não vejo nada de errado nisto. O que me incomoda, como cristão, é ver a divindade de Cristo negada.

No mais, é um bom livro... bem escrito apesar de inferior a Anjos e demônios. Este é bem melhor. A meu ver, O código Da Vinci alcançou tão grande sucesso devido a um importante detalhe que tem a seu favor: é extremamente polêmico.

terça-feira, 24 de agosto de 2010

Fernando Pessoa

Cleonice Berardineli disse em uma entrevista que existe uma estante do lado de sua cama e que o único autor que ela guarda lá é Fernando Pessoa, o único que ela permite que durma ao lado dela. Fernando Pessoa não dorme do meu lado, mas entendo prazer que ela sente em ler seus escritos. Apesar de detestar ler antes de dormir, permito-me, volta e meia, ler um ou dois poemas dele antes de dormir. Recentemente deparei-me com este que agora compartilho, Chuva Oblíqua. O poema, lindamente escrito, trouxe belos sentimentos, conexões e lembranças. Sinto-me em casa quando leio Pessoa e por isso, novamente convido-o para uma visita.
 
           Chuva Oblíqua, Fernando Pessoa - 1914

I

Atravessa esta paisagem o meu sonho dum porto infinito
E a cor das flores é transparente de as velas de grandes navios
Que largam do cais arrastando nas águas por sombra
Os vultos ao sol daquelas árvores antigas...
O porto que sonho é sombrio e pálido
E esta paisagem é cheia de sol deste lado...
Mas no meu espírito o sol deste dia é porto sombrio
E os navios que saem do porto são estas árvores ao sol...
Liberto em duplo, abandonei-me da paisagem abaixo...
O vulto do cais é a estrada nítida e calma
Que se levanta e se ergue como um muro,
E os navios passam por dentro dos troncos das árvores
Com uma horizontalidade vertical,
E deixam cair amarras na água pelas folhas uma a uma dentro...
Não sei quem me sonho...
Súbito toda a água do mar do porto é transparente
e vejo no fundo, como uma estampa enorme que lá estivesse desdobrada,
Esta paisagem toda, renque de árvore, estrada a arder em aquele porto,
E a sombra duma nau mais antiga que o porto que passa
Entre o meu sonho do porto e o meu ver esta paisagem
E chega ao pé de mim, e entra por mim dentro,
E passa para o outro lado da minha alma...

    II

Ilumina-se a igreja por dentro da chuva deste dia,
E cada vela que se acende é mais chuva a bater na vidraça...
Alegra-me ouvir a chuva porque ela é o templo estar aceso,
E as vidraças da igreja vistas de fora são o som da chuva ouvido por dentro...
O esplendor do altar-mor é o eu não poder quase ver os montes
Através da chuva que é ouro tão solene na toalha do altar...
Soa o canto do coro, latino e vento a sacudir-me a vidraça
E sente-se chiar a água no fato de haver coro...
A missa é um automóvel que passa
Através dos fiéis que se ajoelham em hoje ser um dia triste...
Súbito vento sacode em esplendor maior
A festa da catedral e o ruído da chuva absorve tudo
Até só se ouvir a voz do padre água perder-se ao longe
Com o som de rodas de automóvel...
E apagam-se as luzes da igreja
Na chuva que cessa...

    III

A Grande Esfinge do Egito sonha pôr este papel dentro...
Escrevo - e ela aparece-me através da minha mão transparente
E ao canto do papel erguem-se as pirâmides...
Escrevo - perturbo-me de ver o bico da minha pena
Ser o perfil do rei Quéops...
De repente paro...
Escureceu tudo... Caio por um abismo feito de tempo...
Estou soterrado sob as pirâmides a escrever versos à luz clara deste candeeiro
E todo o Egito me esmaga de alto através dos traços que faço com a pena...
Ouço a Esfinge rir por dentro
O som da minha pena a correr no papel...
Atravessa o eu não poder vê-la uma mão enorme,
Varre tudo para o canto do teto que fica por detrás de mim,
E sobre o papel onde escrevo, entre ele e a pena que escreve
Jaz o cadáver do rei Queóps, olhando-me com olhos muito abertos,
E entre os nossos olhares que se cruzam corre o Nilo
E uma alegria de barcos embandeirados erra
Numa diagonal difusa
Entre mim e o que eu penso...
Funerais do rei Queóps em ouro velho e Mim!...

    IV

Que pandeiretas o silêncio deste quarto!...
As paredes estão na Andaluzia...
Há danças sensuais no brilho fixo da luz...
De repente todo o espaço pára...,
Pára, escorrega, desembrulha-se...,
E num canto do teto, muito mais longe do que ele está,
Abrem mãos brancas janelas secretas
E há ramos de violetas caindo
De haver uma noite de Primavera lá fora
Sobre o eu estar de olhos fechados...

    V

Lá fora vai um redemoinho de sol os cavalos do carroussel...
Árvores, pedras, montes, bailam parados dentro de mim...
Noite absoluta na feira iluminada, luar no dia de sol lá fora,
E as luzes todas da feira fazem ruídos dos muros do quintal...
Ranchos de raparigas de bilha à cabeça
Que passam lá fora, cheias de estar sob o sol,
Cruzam-se com grandes grupos peganhentos de gente que anda na feira,
Gente toda misturada com as luzes das barracas, com a noite e com o luar,

E os dois grupos encontram-se e penetram-se
Até formarem só um que é os dois...
A feira e as luzes das feiras e a gente que anda na feira,
E a noite que pega na feira e a levanta no ar,
Andam por cima das copas das árvores cheias de sol,
Andam visivelmente por baixo dos penedos que luzem ao sol,
Aparecem do outro lado das bilhas que as raparigas levam à cabeça,
E toda esta paisagem de primavera é a lua sobre a feira,
E toda a feira com ruídos e luzes é o chão deste dia de sol...
De repente alguém sacode esta hora dupla como numa peneira
E, misturado, o pó das duas realidades cai
Sobre as minhas mãos cheias de desenhos de portos
Com grandes naus que se vão e não pensam em voltar...
Pó de oiro branco e negro sobre os meus dedos...
As minhas mãos são os passos daquela rapariga que abandona a feira,
Sozinha e contente como o dia de hoje..

    VI

O maestro sacode a batuta,
E lânguida e triste a música rompe...
Lembra-me a minha infância, aquele dia
Em que eu brincava ao pé de um muro de quintal
Atirando-lhe com uma bola que tinha dum lado
O deslizar dum cão verde, e do outro lado
Um cavalo azul a correr com um jockey amarelo...

Prossegue a música, e eis na minha infância
De repente entre mim e o maestro, muro branco,
Vai e vem a bola, ora um cão verde,
Ora um cavalo azul com um jockey amarelo...
Todo o teatro é o meu quintal, a minha infância
Está em todos os lugares, e a bola vem a tocar música,
Uma música triste e vaga que passeia no meu quintal
Vestida de cão tornando-se jockey amarelo...
(Tão rápida gira a bola entre mim e os músicos...)

Atiro-a de encontro à minha infância e ela 
Atravessa o teatro todo que está aos meus pés
A brincar com um jockey amarelo e um cão verde
E um cavalo azul que aparece por cima do muro
Do meu quintal... E a música atira com bolas
À minha infância... E o muro do quintal é feito de gestos
De batuta e rotações confusas de cães verdes
E cavalos azuis e jockeys amarelos...

Todo o teatro é um muro branco de música
Por onde um cão verde corre atrás de minha saudade
Da minha infância, cavalo azul com um jockey amarelo...

E dum lado para o outro, da direita para a esquerda,
Donde há arvores e entre os ramos ao pé da copa
Com orquestras a tocar música,
Para onde há filas de bolas na loja onde comprei
E o homem da loja sorri entre as memórias da minha infância...

E a música cessa como um muro que desaba,
A bola rola pelo despenhadeiro dos meus sonhos interrompidos,
E do alto dum cavalo azul, o maestro, jockey amarelo tornando-se preto,
Agradece, pousando a batuta em cima da fuga dum muro,
E curva-se, sorrindo, com uma bola branca em cima da cabeça, 
Bola branca que lhe desaparece pelas costas abaixo...

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Começos...


Na hora do reforço escolar, Natanael batalhava para ler e compreender os textos. Tem preguiça, quer desistir, mas no final das contas esses são alguns cambaleantes primeiros, segundos, terceiros passos...
Eu vou gostar de ser professora...

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Mia Couto, O outro pé da sereia.

Tenho um ritual com livros. Com os livros do Mia Couto eu acrescento um item a este ritual. 
Passo a mão na capa, folheio o livro, cheiro as páginas, checo a orelha, leio o que está escrito atrás, leio a última frase do livro. (Somente a última frase) 

No caso dos livros do Mia Couto com epígrafes, eu faço primeiro a leitura de todas as epígrafes. Sinto-as, deixo que falem comigo, e só depois disso é que começo a ler o livro. Li as epígrafes deste livro, O outro pé da sereia,  deitada em um banco numa praça de brasília. Registrei com uma foto. As epígrafes anunciaram-me com clareza algo que confirmei mais tarde, o livro é fantástico, magnífico. 

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Nada de novo no front...


"Este livro não pretende ser um libelo e nem uma confissão, e menos ainda uma aventura, pois a morte não é uma aventura para aqueles que se deram face a face com ela. Apenas procura mostrar o que foi uma geração de homens que, mesmo tendo escapado às granadas, foram destruídos pela guerra."
(Erich Maria Remarque. Nada de novo no front. Porto Alegre: L&PM, 2010.)

Ao terminar de ler este livro, não sei exatamente o que escrever aqui...

É o tipo de leitura que tem o poder de nos deixar pensativos por longo tempo. Se tenho que descrever o livro em poucas palavras, fico com as do autor do pequeno resumo que acompanha a edição: "assustadoramente comovedor".

Erich Maria Remarque, o autor, combateu nas trincheiras alemães da Primeira Guerra Mundial. Foi ferido três vezes, uma delas gravemente. Na década seguinte tomou notas dos horrores que viveu na frente de batalha, formando o núcleo deste seu livro. Nada de novo no front (Im Western Nichts Neues) foi publicado em 1929, sendo considerado até hoje um dos mais importantes romances pacifistas do século XX. É de impressionar como a experiência vivida pelo autor flui das páginas. Sua impressionante e assustadora descrição do front ocidental e o poder psicológico que exercia naqueles soldados, rapazes de 18 anos que para lá eram enviados para combater, tornam o texto violentamente vivo; as violências da guerra, a descrição de corpos mutilados e a crescente indiferença em relação a tudo isto, os sofrimentos, os momentos de descanço da tropa, as diversas maneiras de adaptação e o cotidiano daqueles jovens soldados são apresentados pelo autor de forma viva e diferente de se ver a guerra. Remarque também traz profundas reflexões e apresenta suas pesadas críticas ao narrar os crescentes questionamentos de seus personagens, a maioria soldados, em relação ao conflito e aos motivos que levam o homem a fazer a guerra. Acho que, destas críticas, a que mais me sinto tentado a registrar aqui é a que diz respeito à influência dos professores.

Comovidos pelos discursos inflamados e ideais nacionalistas de um de seus professores, o protagonista Paul Bäumer e sua turma dirigem-se ao destacamento do bairro e se alistam. Ao ver do que se trata realmente uma guerra, Bäumer nos deixa o seguinte testemunho:

"Os professores deveriam ter sido para nós os intermediários, os guias para o mundo da maturidade, para o mundo do trabalho, do dever, da cultura e do progresso e para o futuro. Às vezes, zombávamos deles e lhes pregávamos peças, mas, no fundo, acreditávamos neles. A idéia de autoridade da qual eram os portadores, juntou-se em nossos pensamentos uma melhor compreensão e uma sabedoria mais humana. Mas o primeiro morto que vimos destruiu esta convicção. Tivemos que reconhecer que a nossa geração era mais honesta do que a deles; só nos venciam no palavrório e na habilidade. O primeiro bombardeio nos mostrou nosso erro, e debaixo dele ruiu toda a concepção do mundo que nos tinham ensinado.

Enquanto eles continuavam a escrever e a falar, víamos os hospitais e os moribundos; enquanto proclamavam que servir ao Estado era o mais importante, já sabíamos que o pavor de morrer é mais forte. Nem por isto nos amotinamos, nem nos tornamos desertores, nem mesmo covardes - todas estas expressões vinham-lhes com muita facilidade. Amávamos nossa pátria tanto quanto eles e avançávamos corajosamente em cada ataque; mas, agora, já sabíamos distinguir, aprendemos repentinamente a ver; e, do mundo que haviam arquitetado, víamos que nada sobrevivera. De súbito, ficamos terrivelmente sós - e, sós, tínhamos de nos livrar de toda esta embrulhada."

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Minha vida vale uma história.

Nunca li uma biografia, não gosto de biografias, elas são parciais e nunca podem revelar o todo, só partes e partes escolhidas, seja boas ou seja más os fatos narrados são selecionados, tanto que não da para se escrever tudo o que fazemos, por isso não gosto de biografias, não leio e talvez nunca leia alguma, mas convido você a ler a minha.
Porque ler minha biografia?
Porque eu não sou parcial, não conto apenas os grandes fatos, não revelo somente o que não quero esconder, minha vida e toda ela posta a pratos limpos, todos podem ver, podem olhar e fazer seu julgamento, seja boa ou seja ruim, heróica ou vergonhosa não esconderei nada, tudo será revelado. Até pensamentos íntimos sobre amigos, amantes, familiares, tudo será exposto, uma verdadeira catarse psicanalistica, falarei e serei falado, mas o que me importa, é a minha vida.
Ler um livro sobre outro alguém é querer saber o que não se sabe, é querer ouvir as coisas secretas escondidas.
Por isso resolvi escrever uma biografia, sobre mim é claro, parto do principio que todos gostam de biografia, de pessoas anônimas então todos adoram (irônico).
Elas são reveladoras, mostram tudo, elas são o meio de se conhecer o outro, na sua pureza, na sua verdade.
Como assim eu sou controverso? Eu não disse que biografias são parciais, nunca disse isso.
Não disse mas escrevi, é por isso que não leio biografias, nem tudo o que está escrito é o que realmente aconteceu. Vale a pena ler biografias, vale, vale como ler revistas, uma revista super interessante.
É por isso que não leio biografias, mas vou escrever uma.

domingo, 11 de julho de 2010

Alice nos visita

Elias José morreu em 2008, com 72 anos. Antes disso, escreveu e publicou diversos contos e poemas. Eu o conheci por acaso enquanto lia A caligrafia de dona sofia, de André Neves. Elias José escreveu a apresentação do livro e alguns dos poemas que André Neves utiliza para dar vida a simpática personagem. Amei os que Elias José escreveu na apresentação, amei os poemas. Por isso, quando vi um novo livro dele ser lançado, eu sabia que queria comprar e me deliciar com seus poemas para crianças. O livro foi lançado um ano depois de sua morte e este ano recebeu um prêmio da revista Crescer. Alice no País da Poesia é um livro que leva nossa querida personagem e o leitor a um delicioso mergulho no mundo da poesia. Semana passada, quando entrei na Malasartes ele estava me esperando, eu não hesitei. Espalhando poesia, acompanhando Alice e apresentado Elias José:

Paisagem Romântica
(Elias José)


Nas noites de lua cheia,
cavalos e cavaleiros seguem
leves, calmos e certos
e buscam novas nuvens
de esperança


Nas noites de lua cheia
cavalos e cavaleiros sonham
em buscam velhos lugares
esquecidos, fora dos mapas.
Buscam muitas históricas
e poemas de amo
para reforçarem a fé
no ser humano
e na vida.

quarta-feira, 30 de junho de 2010

Lendo Fernando Pessoa

A amiga Clarissa apresentou o poema que eu, até o semestre passado, não conhecia, mesmo considerando Fernando Pessoa como meu favorito. Anexei um trecho do filme Palavra (en) cantada no qual o poema foi lido por Maria Bethânia, o filme  foi apresentado pelo professor Ilmar. Hoje resolvi compartilhar o poema, descobri que muitos não conhecem e é belíssimo. Postagem em época de provas nunca é muito longa.

Eros e Psiquê
(Fernando Pessoa)

...E assim vêdes, meu Irmão, que as verdades


que vos foram dadas no Grau de Neófito, e
aquelas que vos foram dadas no Grau de Adepto
Menor, são, ainda que opostas, a mesma verdade. 
                    (Do Ritual Do Grau De Mestre Do Átrio

                        Na Ordem Templária De Portugal) 


Conta a lenda que dormia
Uma Princesa encantada
A quem só despertaria
Um Infante, que viria
De além do muro da estrada.
Ele tinha que, tentado,
Vencer o mal e o bem,
Antes que, já libertado,
Deixasse o caminho errado
Por o que à Princesa vem.
A Princesa Adormecida,
Se espera, dormindo espera,
Sonha em morte a sua vida,
E orna-lhe a fronte esquecida,
Verde, uma grinalda de hera.
Longe o Infante, esforçado,
Sem saber que intuito tem,
Rompe o caminho fadado,
Ele dela é ignorado,
Ela para ele é ninguém.
Mas cada um cumpre o Destino
Ela dormindo encantada,
Ele buscando-a sem tino
Pelo processo divino
Que faz existir a estrada.
E, se bem que seja obscuro
Tudo pela estrada fora,
E falso, ele vem seguro,
E vencendo estrada e muro,
Chega onde em sono ela mora,
E, inda tonto do que houvera,
À cabeça, em maresia,
Ergue a mão, e encontra hera,
E vê que ele mesmo era
A Princesa que dormia.

--
Eros e Psique recitado
Palavra (En) cantada - Maria Bethânia



segunda-feira, 21 de junho de 2010

"te amo até a lua..." (ida e volta)

Meu pai fez aniversário no início do mês. Como ele não queria grandes supresas e nem queria escolher o presente, eu e minha irmã decidimos que faríamos algo diferente. Eu tenho 22 anos e minha irmã 18, mesmo assim, escolhemos um presente de criança. O livro "Adivinha quanto eu te amo" fala sobre um coelhinho filho que quer mostrar ao coelho pai o quanto o ama. (e tenta de tudo, mas o amor do coelho pai sempre parece maior). Meu pai adorou. Os filhos crescem, mas o amor não envelhece. Felizmente. :)

"depois deitou-se ao lado do filho e  sussurou sorrindo:
te amo até a lua... ida e volta"

domingo, 20 de junho de 2010

You've got a friend in me...


Me senti compelido a escrever, embora não saiba bem o que...
Ontem fui ao cinema fechar um ciclo, acho que podemos dizer assim. Tudo começou há um tempão atrás... honestamente não me lembro bem quanto tempo faz. Eu devia ter 9 ou 10 anos... foi quando minha mãe chegou em casa com o VHS do Toy Story. Eu não tinha visto no cinema. Sei que se transformou rapidamente em um dos meus filmes favoritos, junto com Pateta, o Filme. Gostava de ver aqueles brinquedos andando e falando, cheios de vida, se metendo em enrascadas e, é claro, ficava impressionado com o fato de ser um filme inteiramente feito em computação gráfica, o que não impressiona mais hoje. Assisti várias vezes. Quando o Toy Story 2 chegou ao cinema, eu já estava, digamos, ficando velho para isso e as crianças da minha idade não queriam mais ir ao cinema ver "filmes de criança"... mas eu fui mesmo assim e não me arrependi. Ria muito no cinema. Hoje penso em como o pessoal da Pixar foi genial. Bonecos com vida! É tudo que uma criança quer ver! A amizade foi sempre o tema forte dos filmes... O que quero dizer é que hoje considero que Toy Story foi muito importante para esse meu finalzinho de infância. Por isso, fui ver Toy Story 3 ontem e com companhia muito especial. Esperamos por mais de um ano e resolvemos que tínhamos que assistir juntos. Revimos os dois primeiros em 3D nos cinemas (e eu pude ver o 1 na tela grande) e esperamos... Ontem, ao final do filme, coisa rara de acontecer. Me vi enxugando lágrimas no rosto... e fiquei com vergonha... Imaginem só! Um marmanjo barbado, de 23 anos enxugando lágrimas ao ver Toy Story! Mas então a vergonha passou. Eu olhei em volta e vi várias pessoas da minha idade vendo o final da história que elas viram iniciar quando eram crianças. Aliás, crianças na sala eram poucas, pelo menos em idade. Então pensei... o Andy cresceu e eu também. Isso é fantástico! Como disse, fechei um ciclo... com chave de ouro.

sábado, 19 de junho de 2010

José Saramago (1922 - 2010)

Foto: Sebastião Salgado

Retrato do poeta quando jovem
(José Saramago)
 


Há na memória um rio onde navegam 
Os barcos da infância, em arcadas 
De ramos inquietos que despregam 
Sobre as águas as folhas recurvadas. 

Há um bater de remos compassado 
No silêncio da lisa madrugada, 
Ondas brancas se afastam para o lado 
Com o rumor da seda amarrotada. 

Há um nascer do sol no sítio exacto, 
À hora que mais conta duma vida, 
Um acordar dos olhos e do tacto, 
Um ansiar de sede inextinguida. 

Há um retrato de água e de quebranto 
Que do fundo rompeu desta memória, 
E tudo quanto é rio abre no canto 
Que conta do retrato a velha história. 


(In OS POEMAS POSSÍVEIS, Editorial CAMINHO, Lisboa, 1981. 3ª edição)


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Poema à boca fechada
(José Saramago)

Não direi:
Que o silêncio me sufoca e amordaça.
Calado estou, calado ficarei,
Pois que a língua que falo é de outra raça.

Palavras consumidas se acumulam,
Se represam, cisterna de águas mortas,
Ácidas mágoas em limos transformadas,
Vaza de fundo em que há raízes tortas.

Não direi:
Que nem sequer o esforço de as dizer merecem,
Palavras que não digam quanto sei
Neste retiro em que me não conhecem.

Nem só lodos se arrastam, nem só lamas,
Nem só animais bóiam, mortos, medos,
Túrgidos frutos em cachos se entrelaçam
No negro poço de onde sobem dedos.

Só direi,
Crispadamente recolhido e mudo,
Que quem se cala quando me calei
Não poderá morrer sem dizer tudo.


(In OS POEMAS POSSÍVEIS, Editorial CAMINHO, Lisboa, 1981. 3ª edição)