"Cada libro, cada tomo que ves tiene alma. El alma de quien lo escribió y el alma de quienes lo leyeron y vivieron y soñaron con el (...) Los libros son espejos: sólo se ven en ellos lo que uno ya lleva dentro"

(Carlos Ruiz Zafón, La sombra del viento)

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Poesia?

“(Clarice Lispector para Vinícius de Moraes)
- Quero lhe pedir um favor: faça um poema agora mesmo. Tenho certeza de que não será banal. Se você quiser Menestrel, fale seu poema.

- Meu poema é em duas linhas: você escreve uma palavra embaixo e outra em cima porque é um verso.
É Assim:

Clarice
Lispector
- Acho lindo teu nome Clarice.”

(Clarice Lispector entrevistando Vinícius de Moraes. LISPECTOR, Clarice. Vinícius de Moraes in: de corpo inteiro.)

Eu nunca escrevi diários, agenda ou caderninhos. Nesse aspecto sempre fui muito diferente das minhas poucas amigas adolescentes ou pré-adolescentes. Na verdade eu devo admitir que sempre tive dificuldade de confiar, especialmente em mulheres. Minhas grandes amizades de adolescência, pré-adolescência e infância foram, durante algum tempo, apenas dois meninos que disputavam minha atenção e o posto de ‘melhor amigo’, e uma menina com a qual brincava de barbie, lego e casinha é claro. Tomei gosto pela escrita de outra forma. Eu falo sobre o tempo, faço piada, brinco com os outros, mas falar sobre o que sinto é uma dificuldade que carrego desde que consigo lembrar. Então eu descobri a escrita. Excelente terapia que alivia o stress enquanto eu escrevo bobagens absurdas que nunca serão lidas,  e outras que serão postadas em um blog não visitado. Minha (quase única) grande amizade feminina da adolescência lia meus textos exaustivamente e os corrigia atentamente. Isso pode ser uma enorme tortura quando a autora não sabe posicionar vírgulas, usar “porque” ou crase. Na época eu odiava português e tinha feito questão de esquecer tudo que minhas professoras malucas tinham tentando colocar na minha cabeça. Hoje a amiga faz letras e eu aprendi muita coisa em nossa longa trajetória de amizade. Volta e meia eu envio um texto para ser avaliado. Mesmo que hoje ela encontre apenas alguns pequenos e poucos erros em minha escrita, sinto falta sempre dos comentários dela.
Quando eu aprendi a amar a língua portuguesa no meu primeiro ano e superei o trauma ‘Machado de Assis’ no terceiro, juntei coragem e mostrei alguns dos meus escritos para a professora. Um deles foi publicado entre as melhores redações do colégio e eu tive direito até a uma tarde de autógrafos. Entretanto, sou incapaz de escrever sonetos. É uma doença crônica gravíssima. Também por isso, nunca consegui entender o que era aquilo que eu escrevia.
- Eu não sei o que eu escrevo professora, eu só escrevo – Eu disse isso para minha professora e ela sorriu, respondeu com naturalidade – Isso é prosa poética, é o que a Clarice Lispector faz. Leia algo dela.
Imediatamente devorei ‘A Hora da estrela’, depois li outros e ainda estou perseguindo essa mulher graças ao sorriso da minha querida professora. Enquanto tantos ficavam desesperados quando encontravam Clarice no vestibular, eu ficava alegre. Era como reencontrar uma grande amiga. Sem etiquetas, esperas ou cobranças, tinha comigo apenas a felicidade de passar com ela alguns momentos. No meio de 2009 e sua bagunça eu descobri Mia Couto. Prosa poética ou poesia em prosa? - perguntaram para ele. Não me importa, o que me interessa é ser inundada por palavras cheias de beleza, sentidos e sorrisos. Importa-me sorrir enquanto leio, mesmo que seja um riso em meio ao triste ou trágico, gosto de sentir.
Encontrar Mia Couto e sua escrita foi um belo retorno a uma verdade tão gostosa que me foi ensinada por Clarice: Poesia é sentir e escrever vivências, e assim como a existência, não tem grandes protocolos. Esbarro então com a palavra grega poiesis, onde arte é criar e todo fruto das mãos e da mente humana pode ser uma poesia. E sorrio com o Mia Couto em uma das mãos, Clarice na outra e as palavras borbulhando na tela do computador. Poesia é uma simples forma de ler e sentir a vida.

2 comentários:

  1. Queria dizer que agora são três os meninos que disputam sua atenção, senhorita Agnes. Quanto ao cargo, creio que o meu seja invejável!

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  2. Correção: quanto ao posto. Cargo é feio.

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